Faetusa Tirzah
cada corpo um território de saberes
objetivos, subjetivos
mistério feito de sangue e paisagens movediças
labirinto, cornucópia, oráculo
se quem chega é a arcana XVIII talvez não possamos ver
mas perceber as imagens híbridas, íntimas, suas e minhas
acreditá-las, rearranjá-las como num jogo
podemos abrir as cartas, os lábios
beber das águas do ás de copas
na barriga: o rei e a rainha
para além dos nossos umbigos o mundo arcano XXI
o corpo é coletivo
na madrugada a lua, o pesadelo na ala feminina
muros amarelos, mamas inflamadas, cadelas uivando em ruínas
estamos movimentando sensações guardadas
o julgamento está invertido
vejo a fera e a moça na carta da força
a estrela abre a caixa de pandora, espia, respira, conspira ali
ajuda na fuga das lágrimas
trama o fechamento das pálpebras para o levante dos olhos
brilho felino no escuro, um belo conjunto de células miando sobre o telhado
você pode rir se quiser, eu lhe digo que eu quero, e chorar
andarilhar com o arcano zero
pedir licença para o que há de ser pedido
ou simplesmente atravessar e não olhar para trás
nem para os lados, nem para a frente, podemos andar vendadas
farejar um caminho entre objetos cotidianos impregnados de vida e morte
entre buracos, pregos, crucifixos, quadros velhos, fotografias
coisas penduradas nessas paredes, escorregadias, lesmas, vermes
pise leve neste cemitério de ossos e saturnos, nesta areia que escorre: o tempo
são nossos sonhos e planos:
vulvas ao sol em praça pública
o facão de Tuíra, as espadas de Jorge
o cultivo nas frestas das calçadas
mas estamos afastadas das ruas, soterradas em concreto
buscando a passagem do ar
agora vou girar
entrar na saia da vênus com cabeça de bode, abrir os cabelos
possuída por mim, no meu peito nascem fios vermelhos
eles buscam os desenhos nas mãos, seguem para além dos dedos
são medusas libertas, perguntas que não podem ser silenciadas
gritos concentrados em decisões
agora deite-se
podemos ver corvos e noites estreladas
ler efemérides e prever aspectos, uma preparação
solve et coagula, posturas são convocadas
re-existências
abrir cartas no corpo é performance, artecartomancia
não espere um conselho, mas uma jornada
coloque seus objetos numa sacola, eu estarei na porta
a que hoje abri para mim, corporacular número 69
medicina de dois lunares crescentes
no ventre escamado, misericórdia e justiça
pentagrama na testa, a direção é a torre noon
treme e sacode é perigo de queda
mas as pessoas da imagem sabem cair e tocam gentilmente o solo
encostam a cabeça na terra que não é posse, é mãe
chamam de berços as covas, escolhem as melhores sementes,
guardam nos bolsos, plantam como podem
elas vingam
a jardinagem é libertária